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Episódio 01 | Somos a Vila Oculta da Chuva
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Episódio 01 | Somos a Vila Oculta da Chuva
Abertura
Praticamente não havia casas. No lugar, construções elevadas que pareciam tocar o céu nublado, todas envoltas de redes de tubulações desorganizadas. No chão, as ruas eram movimentadas. O ir e vir de pessoas eram sonorizados pelos passos sobre poças de água, o resquício da chuva daquela manhã. E esse era o melhor som que poderia se ouvir naquele lugar. Qualquer outra entoação era ardida aos ouvidos: pedintes sucumbindo à fome, ladrões furtando ou assaltando pedestres indefesos e, mais ao longe, som de lâminas de metal e, por vezes, explosões.
Foi isso que encontrou o jovem Sawamura Jin quando chegou de suas andanças pelo mundo ninja. Por algum motivo, seus pés o haviam guiado até ali, e sentia que poderia encontrar em Amegakure no Sato um recanto para ficar.
— Hmm, que situação decadente. - No topo de um prédio, um homem fazia-se presente. Seus vestes mostravam-se simples: trajava uma camisa verde, com as mangas cortadas; shorts humildes e castanhos; e por final calçados e luvas azuis escuras, comuns pra um shinobi. O mais relevante em sua aparência era a bandana presa ao braço. Ela não somente pertencia a outra vila - ela contava ainda com um risco, revelando deserção. — Não sabia que existiam lugares como esse. - A sua voz era calma, livre de emoções ou pausas. O seu rosto, como se buscasse combinar, não emitia expressão alguma. Ainda que estivesse frente a uma situação desesperadora tal qual era a de Amegakure, ele nada esboçou. Estava mais preso à curiosidade que à empatia - ou a falta dela. No entanto, continuar por ali significava que buscava algo por aquele local, ou no mínimo pretendia fazer alguma coisa. — Vejamos. - Finalmente seu rosto começava a tornar-se mais nítido, pela primeira vez em alguns minutos em meio a aquele denso ar e fumaça que cobria a vila. Os seus olhos esverdeados eram o que mais chamavam a atenção, que juntos à sua pele bronzeada deixavam clara a sua origem: Kumo. Com um piscar de olhos, o rapaz se moveu. Ressurgindo ao chão, quase que num flash, ele deixou emitir por um pequeno e breve instante uns feixes de raio em sua volta, como se tivesse feito uso de alguma técnica extraordinária. Observando tudo ao seu redor, decidiu passear por ali, como parte de sua exploração em Ame.
Caminhando despreocupadamente, Jin esbarrou em mais uma cena cotidiana: um Lorde também andava por aquela rua. Recém-chegado, ainda era desconhecido ao ninja de Kumo o que aquele nome significava. Lorde era o título que todo dono de indústria de Amegakure dava a si próprio. Por não haver qualquer outra alternativa, eles também transitavam pelas mesmas ruas dos homens comuns e dos mendigos, mas sua distinção deles era mais que nítida. Os trajes eram mais vultuosos, a postura e a prepotência no andar eram nítidas e, sobretudo, a segurança em volta era altíssima. Afinal, nenhum Lorde gostaria de se ver ameaçado por um civil qualquer, roubado por um meliante ou tocado por um pedinte. Aquele Lorde que passava era jovem, assim como a maioria dos empreendedores industriais. A pele era clara pela falta de sol e os olhos negros fundos e bem marcados, quase como se tivesse olheiras. À sua volta, quatro homens armados com katanas e mais um ao final sem arma aparente, com um tapa-olho e um respirador, objeto bem comum entre os ninjas da vila.
— Saiam! Saiam da frente! Lorde Sakamoto está passando, seus imprestáveis! — era o que bradava um dos homens armados da frente, empurrando qualquer um que estivesse no caminho. Fez isso por alguns minutos, até que um morador de rua o segurou em uma das pernas e estendeu a mão pedindo esmola. Com ódio e puro nojo na face, sacou sua katana sem pensar duas vezes. — Seu imundo! Como ousa! Cortarei fora sua mão para que aprenda! — foi o que disse, iniciando o movimento para brandir sua espada.
Os olhos de Jin se arregalaram, num tom de surpresa emitido pelo mesmo. — Oh, ele vai cortar mesmo o cara. - Inclinando um pouco o pescoço, começou a olhar de forma meio distorcida para a situação, como se refletisse sobre se deveria intervir ou não. Ficou pensativo por alguns instantes, mas logo decidiu. — É, não vai dar... - Como se tivesse dado somente um passo de tão rápido que foi, ressurgiu ao lado do morador de rua, encarando o espadachim que ameaçava corta-lo. — Não vai dar pra você fazer isso não, moço. — Ainda que estivesse em uma situação um tanto quanto inusitada — pode lhe render um grande perigo — Jin parecia não se importar tanto. Ele não estava ali por algum motivo heroico, ele somente sentia que alguém precisava defender o homem. E se não ele, quem mais?
Tudo fora tão rápido que custou um pouco até que todos entendessem o que havia ocorrido, principalmente o homem que estava prestes a decepar o braço do pedinte, que parou no ato, confuso. Um clarão de se abriu no meio da rua. As pessoas se afastaram ainda mais, com receio de que algo acontecesse com elas, mas poucos foram o que deixaram o lugar. A maioria estava curiosa para saber o desfecho daquela cena incomum que irrompeu no porco cotidiano de Amegakure. — Q-q-que? De onde você saiu?! — interrogou o homem, ainda incrédulo, forçando-se para conter o gaguejo e recuperar a tranquilidade abalada pelo surgimento daquele desconhecido. — Saia você também! Ou lhe cortarei a cabeça pela insolência!
— Não faça besteira, Isao. — foi o que disse outra voz, grave e mais velha, vindo ao fundo. O homem de tapa-olho se aproximava calmamente, a passos curtos. Sua voz era abafada pelo respirador, mas perfeitamente compreensível. — Esse aí, seja quem for, não é mercenário medíocre como você. É um ninja. Se fizer alguma besteira, é você quem acabará sem a cabeça. Deixe-o comigo.
A atenção dos olhares curiosos se intensificou neste momento. Todos queriam fugir, mas a vontade ver o que sucederia àquilo era maior. E ficaram no lugar. Não se ouvia respiração, sussurro ou qualquer outro som, ainda que ínfimo. Parecia que até o tempo havia parado para ver com cuidado a cena. E eis que, finalmente, gotas de água começaram a cair. No momento mais inoportuno, Sawamura Jin conheceu a chuva de Amegakure. A precipitação começou leve, e logo se intensificou. Logo, somente o som das gotas ao chão eram ouvidos... ou não. — Nossa! Chuva! E eu nem trouxe o guarda-chuvas, Yagura-san! Vou ficar toda molhada... O que está acontecendo?
Dois novos atores surgiam. O primeiro deles era uma linda jovem de cabelos negros e compridos. Os olhos verdes se destacavam no contraste com o tom dos cabelos e da pele clara. As roupas, bem bonita e adornadas, mesmo para uma kunoichi, também traziam tons de azul e verde, talvez para combinar com a iris do olhar. Seu nome, como logo seria revelado, era Kazuha. Ao seu lado, seu novíssimo noivo, Fuuma Yagura.
De braços dados com sua noiva, Yagura observava de olhos estreitos o terrível declínio que abatia a sociedade de seu país. Há não tanto tempo havia feito mais sacrifício por sua terra que todas essas pessoas reunidas - e embora um de seus lados o compelisse a continuar nesse caminho, o outro se irritava pela maneira como os próprios cidadãos da Chuva se conformavam com o status quo. Naquele dia, o Shinobi trazia um kimono escuro e formal, sem maiores adornos além da gigantesca shuriken de quatro lâminas estampada em suas costas. Nos pés, uma sandália tipicamente japonesa ecoava com som de madeira contra asfalto a cada passo, quebrando o silêncio da cena: — Nossa aliança é recém-formada, assim como a união de nossas famílias... Mas espero que não esteja pensando que pode fazer o que quiser por aqui apenas por isso, sabendo minha posição, Kanzou-san. — Os passos pausaram, dando lugar apenas a sua voz. Embora tenha ignorado o comentário de sua esposa em prol de se atentar ao perigo que poderia logo poderia eclodir no meio daquela rua, não largou o braço da moça, mesmo assim. Estendeu o braço livre para cima, de mãos abertas e voltadas para trás, mostrando preso a seu pulso e antebraço um pergaminho de coloração negra e tingida à letras prateadas, com as bordas ornamentadas pelo símbolo de seu clã: — Se afaste. Agora. — Ordenou ao homem-abutre. O tecido do kimono de Yagura lentamente escurecia conforme absorvia a água da chuva, assim como seus cabelos.
Jin mostrou-se confuso - ele não sabia se devia se preparar para um combate ou assistir à cena dos dois recém-chegados. Olhando para o homem que havia tomado a frente pronto a enfrenta-lo, ou o quer que tenha tentado dizer com 'deixe-o comigo', ficou pensativo sobre o fato de lutar com ele. "Eu preferia lutar com o espadachim ali, sendo sincero... Ele nem reagiu ao meu movimento." — Eis que viu a ordem do homem desconhecido, na tentativa de expulsar o seu provável adversário dali. Ainda que não soubesse direito da situação, não havia porque persistir ali. Se o morador de rua estivesse a salvo, seu trabalho estava feito. Olhando para este último, checou se estava tudo bem com ele e tratou de empurra-lo, de um modo mais grosso e direto do que deveria - em contraste à sua tentativa de salva-lo. — Você. Saia, por favor. Não quero ter que salva-lo de novo. — E, esperando que ele assim o fizesse, Sawamura começou a dar passos na direção contrária, prestes a ir embora.
— Os Fuuma e os Anjos... E eu que pensava que se tratava somente de um rumor ridículo... Mas vejo com meus próprios olhos que não é mera falácia. — Foi o que respondeu o homem agora nomeado Kanzou. Este era um dos líderes do Clã dos Abutres, uma das cinco facções de poder de influência em Amegakure. O homem levou a mão ao respirador, ajeitando-o na face para talvez reduzir algum incômodo, e então prosseguiu a falar. — Sou homem vivido, Fuuma Yagura-san. Reconheço sua força, mas minha experiência é maior. Não sou idiota para enfrentar os líderes dos dois clãs sozinho, muito menos no território dos Anjos. Só saiba que atravessar essa rota é inevitável ao Lorde Sakamoto, e tenho a permissão de Kazuha-san para escoltá-lo por aqui. É certo que meus homens se excederam... Mas quem liga para esse coitado aí ao chão? Até mesmo seu "salvador" o empurrou longe como se pouco fosse. Enfim. Peço desculpas, e já me retiro. — disse, fazendo sinal com as mãos para que o grupo voltasse a andar. E enquanto passavam por Yagura e Kazuha, falou em baixo tom. — Não pense que os demais clãs ficarão parados ao ver essa "aliança", Yagura-san...
Balançando a cabeça em sentido negativo, Yagura respirou fundo e deixou exalar um suspiro curto, continuando a caminhar. De seu pergaminho, com um movimento rápido de mãos, surgiu um guarda-chuva negro, de barra prateada, que prontamente abriu para abrigar-se da chuva junto de sua esposa: — Não me importo que faça seu trabalho, mas enquanto estiver nesse território, você, seus homens ou seu cliente não levantarão a mão para um local sem justa necessidade. Do contrário, é guerra. Informe isso a quem achar necessário. — Parte do que o abutre havia dito era verdade. Nem mesmo os cidadãos se importavam uns com os outros por ali — mas era justamente essa mentalidade que Yagura havia se proposta a mudar, sob o manto de seu clã e de seus antepassados. Chegou ao ponto de matar seu próprio tio e expulsar seu próprio irmão em nome da defesa desse ideal: — Perdão, Kazuha. — Foi o que se limitou a dizer para a mulher. Com certa calma, seguiu adiante até o estranho ninja de Kumo — o corte na faixa que carregava em muito o intrigava: — Não sei o que um Nukenin faz por essas partes, mas agradeço por ter intervindo em nome daquele senhor.
Sawamura Jin> Jin já estava perto de ir embora dali, quando foi interrompido pela tentativa do homem de agradece-lo. As suas palavras chegaram a si em todo o instante, mesmo quando dialogava com aquele que estava prestes a ser seu adversário. Despertou seu interesse, mesmo que apenas por alguns momentos, de modo a faze-lo responder: — Não sei ainda porque fiz isso, mas de nada. — Surpreendeu-se um pouco ao ser chamado de nukenin. — "Acho que não me acostumei ainda em ser chamado dessa forma... Mas é bem raro alguém reparar no corte em minha bandana." — Sawamura ficou pensativo por alguns segundos, como se estivesse prestes a tomar alguma decisão, por mais aleatória que viesse a ser. — Você, pelo modo que falou antes, parece ser alguém importante nessa disputa de facções. Vou segui-lo, tá decidido. — Agindo com a maior naturalidade possível, Jin prontificou-se a fazer parte da facção de Yagura, ainda que nem o seu nome soubesse, ou ao menos tenha sido convidado. — Não sei que o que busca, mas deu pra entender um pouco pela forma como reagiu em relação a aquele homem. Só sei que aceitaria viver em uma vila sob os ideais que você segue. Isso basta. Lutarei ao seu lado, decidi. - Olhando de lado para as demais pessoas que faziam-se presentes no local, prosseguiu, ainda que estivesse as ignorando totalmente. — Qual o nome da nossa facção? — Por mais estranho que parecesse a situação, aquilo fazia todo o sentido para Jin. Yagura era o seu oposto: ele buscava mudar tudo, liderar e ainda possuía um senso de justiça que o agradava. Não precisava de mais que apenas alguns minutos para entender isso. Ainda que estivesse errado, era um bom ponto de partida, agora que havia chegado em Amegakure. Sawamura decidiu contar com o seu instinto.
A estranha reação do nukenin pegou Yagura desprevenido. Num momento raro, um curto sorriso se abriu na boca do Shinobi, que olhou para baixo por alguns instantes. Enquanto os pingos de chuva caíam no asfalto, formando pequenas poças nas depressões que haviam aqui e ali até escoarem pelos mil boeiros coligados ao labirinto de canos, uma realização estranha veio à cabeça do homem — até então, ele havia lutado afim de defender o país, porém sob a bandeira de seu clã, do clã de sua esposa. Era hora disso mudar. Erguendo o rosto, apertou mais o braço de sua esposa e emparelhou com Jin, lateral ao rapaz, de forma que o grande guarda-chuva que cobria a si e a sua esposa também o protegesse da chuva: — A Vila Oculta da Chuva. Esse é o nome da facção. — E assim, continuou a andar, esperando que o estranho o seguisse. Aos olhos de Yagura, um Nukenin não era inimigo, mas um aliado em potencial. Embora não fosse alheio ao motivo pelo qual alguns fugiam ou eram banidos de suas vilas, a atitude do ninja de Kumo mostrava, ao menos nesse primeiro momento, se tratar de alguém a quem poderia se aliar: — Fuuma Yagura. Essa é minha esposa, Kazuha. — Concluiu, a figura do trio se reduzia, desaparecendo ao longe em mais um dos mil becos de Ame.
Darthix- Lendário
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